Foto 1. Coronal Janela de CAI. No lado esquerdo, não há sinal de membrana timpânica, cadeia ossicular, esporão de Chaussé ou parede lateral da orelha média. Este padrão de imagem seria esperado num paciente submetido a cirurgia, mas neste caso a paciente de 64 anos, que referia perda auditiva, não relatava nenhum procedimento cirúrgico prévio.
Foto 2. Axial janela de CAI (nível inferior). A seta evidencia imagem com densidade de partes moles na porção posterior da orelha média. Este material tem forma irregular e limites definidos, em contato com a parede óssea da mastóide.
Foto 3. Axial Janela de CAI (Nível do canal semicircular lateral). Neste corte a seta também evidencia imagem com densidade de partes moles adjacente à parede óssea.
Foto 4. Coronal Janela de CAI (posterior). Esta imagem evidencia um achado importante. Note que a seta pequena indica material isodenso com forma algo arredondada e bem definida. A seta grande indica componente linear que se destaca da lesão.
Diante da história clínica e dos achados de imagem, estamos diante de um caso de automastoidectomia secundária a colesteatoma.
Mas o que seria colesteatoma mural e como se desenvolve uma automastoidectomia?
Diante da história clínica e dos achados de imagem, estamos diante de um caso de automastoidectomia secundária a colesteatoma.
Mas o que seria colesteatoma mural e como se desenvolve uma automastoidectomia?
O colesteatoma é uma lesão não neoplásica que se organiza de tal forma a ter 3 regiões bem definidas: perimatriz, matriz e o conteúdo cístico. A matriz é um tecido escamoso epitelial semelhante a pele, que está permanentemente porduzindo queratina. A queratina produzida na matriz se "descama" e vai sendo "empurrada" para o conteúdo cístico, este por sua vez acumula lâminas de queratina e vai crescendo continuamente. A perimatriz, por sua vez, camada externa à matriz que mantém contato com a mucosa da orelha média, é constituida de fibras colágenas e células inflamatórias com suas citocinas. O processo inflamatório na perimatriz está sempre estimulando a produção de tecido cicatricial da própria perimatriz, bem como proliferação de fibroblastos e da matriz. Por outro lado, este mesmo processo inflamatório provoca a formação de tecido de granulação, que ativa a reabsorção óssea através do aumento da atividade dos osteoclastos do osso adjacente. Lembrando que a perimatriz é microscópica e às vezes visível somente ao microscópio eletrônico.
Para resumir, é na perimatriz que está o potencial de erosão óssea e crescimento contínuo do colesteatoma, que se dá através da interação inflamatória constante entre a mucosa da cavidade timpânica e a perimatriz.
E daí?
E daí?
E daí que, eventualmente, em certo momento, a estrutura do colesteatoma se rompe e o conteúdo cístico que responde por praticamente todo o volume da lesão é drenado espontaneamente. É como se ficasse somente a "casca" do colesteatoma, enquanto o conteúdo cístico, o "recheio", é drenado pela orelha externa. Pois bem, a matriz e a perimatriz continuam lá a produzir inflamação e erosão óssea, erosão óssea, erosão óssea, erosão óssea... e assim vai. Nesta situação o estudo tomográfico exibe orelha com sinais de erosão óssea, sem cadeia ossicular, sem parede lateral da orelha média, mas também sem praticamente nenhum material no interior da cavidade. Por isso o radiologista pode se perguntar "o que aconteceu?", "como assim não foi operado?", "aonde está o colesteatoma?". O colesteatoma foi drenado espontaneamente e só restou sua "casca" (matriz, perimatriz), que geralmente é muito fina e invisível ao estudo de imagem. Esta situação que chamamos de AUTOMASTOIDECTOMIA em consequência de um COLESTEATOMA MURAL, que corresponde ao colesteatoma que perdeu sua forma pela drenagem do conteúdo cístico.
Em nosso caso, a automastoidectomia está associada à provável conteúdo cístico remanescente do colesteatoma (Foto 2, 3 e 4). É claro, pode coexistir tecido fibrocicatricial em meio a este componente isodenso. Na foto 4, evidencia-se a "casca" do colesteatoma muito bem definida (Seta grande). Vale ressaltar que nem sempre tal imagem de "casca" do colesteatoma é visível. Neste exame, pela presença de provável remanescente do conteúdo cístico, a ressonância magnética com técnica de difusão seria importante para definir o que é colesteatoma e o que não é (tecido cicatricial/granulação não colesteatomatoso associado).
Colesteatoma mural é uma das poucas situações onde o estudo RM com técnica de difusão não tem boa sensibidade, visto que a lesão laminar pode ser muito fina, aderida ao osso e com pouco volume.
Um conceito muito importante e baseado na estrutura e fisiopatologia do colesteatoma é: mesmo que o volume da lesão esteja quase reduzido a zero, não se deve esquecer que a matriz e principalmente a perimatriz ainda estão lá. Portanto um colesteatoma mural mínimo, uma imagem de automastoidectomia quase sem nenhum material de preenchimento visível no exame tomográfico, continua a se desenvolver, crescer e erodir osso adjacente.
Existem relatos de caso na literatura onde foi descrito automastoidectomia secundária a queratose obliterante, mas é raro. A regra é relacionar automastoidectomia ao colesteatoma mural.
Este esquema simples mostra a "casca" do colesteatoma representada pelas linhas azul (matriz) e vermelha (perimatriz), enquanto o volume da lesão se dá pelo conteúdo cístico (lilás) rico em queratina. Na imagem inferior, uma idéia daquilo que acontece no colesteatoma mural, quando o conteúdo cístico que reponde pelo volume da lesão é drenado. Vale lembrar que a matriz é muuuuuito fina e a perimatriz as vezes só é visualizada pelo microscópio eletrônico, portanto praticamente tudo que vemos na TC é conteúdo cístico.
Em nosso caso, a automastoidectomia está associada à provável conteúdo cístico remanescente do colesteatoma (Foto 2, 3 e 4). É claro, pode coexistir tecido fibrocicatricial em meio a este componente isodenso. Na foto 4, evidencia-se a "casca" do colesteatoma muito bem definida (Seta grande). Vale ressaltar que nem sempre tal imagem de "casca" do colesteatoma é visível. Neste exame, pela presença de provável remanescente do conteúdo cístico, a ressonância magnética com técnica de difusão seria importante para definir o que é colesteatoma e o que não é (tecido cicatricial/granulação não colesteatomatoso associado).
Colesteatoma mural é uma das poucas situações onde o estudo RM com técnica de difusão não tem boa sensibidade, visto que a lesão laminar pode ser muito fina, aderida ao osso e com pouco volume.
Um conceito muito importante e baseado na estrutura e fisiopatologia do colesteatoma é: mesmo que o volume da lesão esteja quase reduzido a zero, não se deve esquecer que a matriz e principalmente a perimatriz ainda estão lá. Portanto um colesteatoma mural mínimo, uma imagem de automastoidectomia quase sem nenhum material de preenchimento visível no exame tomográfico, continua a se desenvolver, crescer e erodir osso adjacente.
Existem relatos de caso na literatura onde foi descrito automastoidectomia secundária a queratose obliterante, mas é raro. A regra é relacionar automastoidectomia ao colesteatoma mural.
Este esquema simples mostra a "casca" do colesteatoma representada pelas linhas azul (matriz) e vermelha (perimatriz), enquanto o volume da lesão se dá pelo conteúdo cístico (lilás) rico em queratina. Na imagem inferior, uma idéia daquilo que acontece no colesteatoma mural, quando o conteúdo cístico que reponde pelo volume da lesão é drenado. Vale lembrar que a matriz é muuuuuito fina e a perimatriz as vezes só é visualizada pelo microscópio eletrônico, portanto praticamente tudo que vemos na TC é conteúdo cístico.
Caso muito bonito e muito bem discutido! Parabéns pela didática! Estou escrevendo minha dissertação de mestrado sobre difusão e colesteatoma, se você puder me enviar as referencias utilizadas para escrever este caso agradeço.
ResponderExcluirCordialmente,
Cecília Brito (cgmelo09@yahoo.com.br)
Obrigado Cecilia. Podemos trocar informações sobre colesteatoma porque é um tema que também tenho muito interesse.
ResponderExcluirAbraço
Marcio Duarte